Resenha de McLuhan, Marshall. “O meio é a mensagem”.


Resenha de McLuhan, Marshall. “O meio é a mensagem”. In: Os meios de comunicação como extensões do homem. 4.ed. São Paulo: Cultrix, 1964[1]
Ana Claudia Fernandes Gomes[2]
Em 1964, Marshall McLuhan afirmou que “o meio é a mensagem” e assim, anunciou e também profetizou a vanguarda dos estudos comunicacionais, que diante das transformações tecnológicas dos séculos XX e XXI, produziriam uma nova forma de compreensão do mundo, a partir do reconhecimento dos meios de comunicação como extensões físicas e psíquicas do ser humano.
O autor afirma que os meios de comunicação introduzem novos hábitos de percepção e participação do público, uma vez que a tecnologia cria um “ambiente humano totalmente novo” e gera processos ativos. Tal abordagem contradiz a construção frankfurtiana do espectador passivo da indústria cultural. McLuhan descreve a “era eletrônica”, a “velocidade elétrica”, a “sobrecarga de informações” e sugere a observação de padrões para a compreensão e a sobrevivência em um redemoinho de novidades configuradas e estruturadas socialmente.
“O ‘conteúdo’ desse novo ambiente é o velho ambiente (...) o novo ambiente reprocessa o velho (...) este ambiente antigo se foi elevando à categoria de forma artística (...) à medida que tecnologias proliferam e criam séries inteiras de ambientes novos, os homens começam a considerar as artes como ‘antiambientes’ ou ‘contra-ambientes’“ (pgs11-12)
Em relação à educação, o autor anuncia uma era na qual as descobertas superam as instruções em um processo participativo de aprendizado. E as artes são “ambientes-radares” que promovem a preparação para as descobertas.
A televisão foi a grande novidade da “tecnologia elétrica” analisada por McLuhan,  porém, as “extensões do homem nos sentidos e nos nervos”, estenderiam-se, segundo o autor, à consciência em um processo criativo e coletivo do conhecimento humano. Essa grande transformação foi anunciada antes da criação da Internet e das redes sociais, que assim como a televisão, aboliriam o tempo e o espaço em um “abraço global” de uma “aldeia global”, criados por força da “implosão elétrica, que obriga ao compromisso e à participação”
O capítulo intitulado “O meio é a mensagem” apresenta os conceitos fundamentais da teoria mcluhaniana e indica que os meios e os veículos da comunicação e da informação são extensões do ser humano, que são recriadas com as novas tecnologias. Segundo o autor, “a luz elétrica é informação pura (...) um meio sem mensagem”. O meio configura as ações humanas, independente do conteúdo da mensagem, pois o meio é a mensagem. Rádio, telégrafo, telefone e televisão eliminam “o espaço e o tempo das associações humanas” e assim, criam a “participação em profundidade”. A eletricidade causou a revolução da “velocidade instantânea” por trazer a simultaneidade das informações e das relações sociais, superando a fragmentação ou concatenação da era mecânica, sendo o cinema representativo desse processo. O autor também cita o cubismo, que a partir da simultaneidade de cores e formas, favorece a “apreensão total instantânea” porque o meio é a mensagem.
Ao alertar que os meios impõem seus pressupostos e que há necessidade de compreender as inovações e os desafios da cultura do “novo mundo elétrico”, movimentado pela “velocidade elétrica”, o autor afirma:
“os efeitos da tecnologia não ocorrem aos níveis das opiniões e dos conceitos: eles se manifestam nas relações entre os sentidos e nas estruturas da percepção, num passo firme e sem qualquer resistência” (pg. 34)
Para a compreensão dos marcos culturais de uma época, McLuhan sugere que a análise de programas e “conteúdos” transmitidos pelos meios de comunicação é insuficiente, sendo fundamental a análise dos próprios meios em suas especificidades.
Em uma crítica às teorias frankfurtianas, o autor afirma que “a aceitação dócil e subliminar do impacto causado pelos meios transformou-os em prisões sem muros para seus usuários” (pg.36) E enfatiza que “cada produto que molda uma sociedade acaba por transpirar em todos e por todos os seus sentidos” (pg.37), reiterando assim, o estudo dos meios de comunicação como extensões dos sentidos humanos em seus aspectos físicos e psíquicos, configurados em uma consciência coletiva.
Para finalizar essa resenha, aceitar-se-á a sugestão de McLuhan que afirma: “um manual bastante completo para o estudo das extensões do homem poderia ser organizado compilando-se citações de Shakespeare” (p.23). Nesse sentido, reitera-se a contemporaneidade do autor para as pesquisas sobre cultura digital, internet e plataformas digitais, invenções posteriores às analisadas por ele. Como diria Shakespeare em “Romeu e Julieta”: “Sê outro nome. Que há num simples nome? O que chamamos de rosa sob uma outra designação teria igual perfume”. Sobre o debate intermediado por aceitações e resistências em relação às novas lógicas e literacias contextualizadas pela cultura digital no mundo contemporâneo, Shakespeare em “Hamlet” afirmaria: “Ser ou não ser, essa é a questão: será mais nobre suportar na mente as flechadas da trágica fortuna, ou tomar armas contra um mar de obstáculos e, enfrentando-os, vencer?” 



[1] Resenha elaborada como aproveitamento da disciplina “Novas lógicas e literacias emergentes no contexto da educação em rede: práticas, leituras e reflexões”, ministrada pela Profa. Dra. Brasilina Passarelli. Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação. CCA/ECA – Universidade de São Paulo. Setembro de 2019.
[2] Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação ECA/USP. Mestre em Sociologia FFLCH/USP. anaclaufg@gmail.com


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