Resenha Coletiva Artigos 2011 a 2018


Resenhas Trabalhos da disciplina 2011-2018
Por: Ana Claudia F. Gomes, Barbara Endo, Elaine Rocha e Roberta Soledade




Este trabalho coletivo, em formato de resenhas, tem como objetivo mapear os trabalhos realizados pelas turmas da disciplina “Novas lógicas e literacias”, sob a orientação da Profa. Dra. Brasilina Passarelli, durante a última década. Além do aprendizado conceitual, o mapeamento permite-nos observar as mudanças culturais da sociedade hiperconectada, em suas interfaces com a Comunicação e a Educação e as multisensorialidades da cultura digital, durante a segunda década do século XXI.

2011

A partir do texto “Interfaces das ferramentas da web 2.0 na construção dos textos coletivos da disciplina CCVAP de 2001”, de 2011, foi possível perceber uma análise dos recursos tecnológicos presentes na época, isto é, das TICs (Tecnologias de Comunicação e Informação) e  suas maneiras de interação com a sociedade da época. 
Tendo como base os avanços tecnológicos ocorridos desde a década de 1970, o texto perpassa as consideradas inovações da época, desde o surgimento dos primeiros computadores (em 1945) e microcomputadores (de 1977) à liberação da Internet para uso comercial (década de 80).  O texto ainda aborda a questão antes dos anos 2000, quando a internet possuía interfaces pouco amigáveis e intuitivas.
Em um movimento contínuo, a produção discorre sobre como as interfaces tornaram-se mais simples, de maneira que os usuários não precisavam de conhecimento técnico nenhum para navegarem na Internet. 
Neste crescente, o texto apresenta a chamada WEB 2.0,  a qual designa a segunda geração de ferramentas e serviços disponibilizados na Internet, as quais viabilizaram a ampliação das formas de participação direta dos atores na rede, incluindo a criação e o compartilhamento de informações e conteúdos on-line.
É mostrada uma infinidade de ferramentas que revolucionaram a área da educação com o apoio dos diferentes aparatos tecnológicos. Foram citadas, as wikis (plataformas de colaboração coletiva), os blogs, fotologs, comunicadores instantâneos e também os ambientes virtuais de aprendizagem. Outros serviços citados nessa “revolução da WEB 2.0” foram plataformas de vídeo online como o YouTube, os sites crowdfunding (iniciativas de financiamento coletivo) e os serviços de imagens via satélite como o Google Earth. 
Baseados na tendência 2.0, em que todos tornaram-se membros ativos para aprender e ensinar, discorreu-se a respeito da navegação mobile e do uso de aplicativos no cotidiano das pessoas e professores até o ano de 2011, em que o mundo da Web 2.0 está nos PCs e também nos smartphones, não com o impacto atual, mas também bastante significativo.
Neste sentido, o contato com o texto mostra que, em 2019, enquanto anseia-se por por uma “Web 3.0”, ou uma “3ª onda”, talvez seja preciso lembrar também que, ao contrário do que acontece com o mundo dos softwares, em que a versão mais nova de um aplicativo elimina a anterior, a Web 2.0 não “matou” a 1.0 e, portanto, a 3.0 seria apenas uma série extensões de movimentos e acontecimentos da história. 
Esse contexto  também pode ser chamado de Web 3.0, no qual a informação aparece de forma organizada para que não somente os humanos possam entendê-la, mas principalmente as máquinas, de maneira que elas possam responder pesquisas e perguntas com uma solução concreta, personalizada e ideal. Trata-se de uma internet cada vez mais próxima da inteligência artificial. É um uso ainda mais inteligente do conhecimento e conteúdo já disponibilizado online, com sites e aplicações mais inteligentes, experiência personalizada e publicidade baseada nas pesquisas e no comportamento de cada indivíduo.

2013

“A emergência da concepção do Prosumer na era da comunicação digital”

O trabalho realizado pelo grupo em 2013, parte do contexto que a internet, web e redes sociais promoveram a convergência entre "velhas" e "novas" mídias, em uma coexistência na qual o papel de emissor e receptor se alteraram radicalmente, passando a se sobrepor em um mesmo sujeito, que deixa de ser passivo no consumo de conteúdos, passando a atuar, também, na produção e disseminação dos mesmos. Assim, nasce a concepção de prosumer, termo consolidado pelo economista Alvin Toffler, há cerca de 35 anos, que uniu os conceitos de produtores e consumidores de conteúdos em uma mesma palavra, partindo do seu olhar visionário que buscou prever como agiriam os sujeitos na sociedade pós-industrial, de transmercado e interconectada globalmente, denominada de a "terceira onda".

Sobre a contemporaneidade, estudiosos como Pireddu, Passarelli, Lipovetsky, Santaella, Di Felice, entre outros, reforçam a presença dos prosumers, por meio de estudos que envolvem o papel da interatividade nos processos comunicativos e a inegável mudança nas formas de ser e estar em um mundo mediado pelas tecnologias, no qual se fundem os papéis de emissor e receptor, somados também ao papel de disseminador.

Para reforçar a mudança social no comportamento comunicativo, foram resgatados estudiosos como Passarelli, Castells, Morin, Wolf e McLuhan, que retratam a teoria clássica da comunicação de massa, evidenciando o quanto vivemos um novo momento, no qual os sujeitos lidam com a arte de comunicar pelo viés da participação coletiva, interação e literacia em diversas plataformas midiáticas.

Não havendo mais barreiras entre quem produz, quem consome e quem dissemina conteúdos, temos que a era dos prosumers opera pela customização dos processos comunicativos, caracterizando um  novo modelo mental no qual se busca produtos e plataformas que possibilitem ecossistemas de inovação para que os sujeitos sejam capazes de criar e compartilhar, o que converge para o conceito de agenda setting que descreve o efeito social da mídia na seleção, disposição e incidência de notícias sobre temas que os sujeitos irão discutir. E, como reflexão sobre o papel da educação nesse cenário, preconiza-se que a escola não pode se abster de aprender, incorporar e ensinar pelo viés de um mundo em que a comunicação está cada vez menos mediada, sendo mais ativa por meio de sujeitos sedentos por participação na construção de conteúdos.

2014

“A presença de conteúdos de tecnologia nos currículos dos cursos de educação e/ou pedagogia: mapeamento no Brasil, nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Austrália”
O trabalho aborda a deficiência da formação acadêmica dos professores relacionada ao uso das tecnologias na educação. De acordo com os autores, as matrizes curriculares dos cursos de pedagogia deveriam contemplar atividades e conteúdos que favorecessem o contato do futuro educador com as potencialidades dos meios digitais.
Diante dessa necessidade, o trabalho buscou investigar “como os currículos de graduação em pedagogia proporcionam aos graduandos acesso, por meio da grade curricular, a conteúdos que abordem conceitos, aplicabilidades e reflexões sobre as tecnologias e sua potencial relação com o ambiente escolar e o processo de ensino-aprendizagem”.
Com o intuito de construir um status de como os conteúdos acadêmicos dos cursos em estudo estão concatenados ou não com o cenário contemporâneo, mapearam as matrizes curriculares dos cursos buscando identificar como estão estruturados os cursos para atender os alunos provindos de uma geração tecnológica, criando estratégias tanto metodológicas quanto didáticas para propiciar uma melhor formação docente.
Para isso analisaram os cursos de graduação em Pedagogia de três universidades brasileiras e os cursos de três universidades internacionais de destaque de acordo com o QS World University Rankings, tido como referência para o programa Ciência Sem Fronteiras da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Os cursos pertencem às seguintes universidades: University of London (Reino Unido), Harvard University (Estados Unidos), University of Melbourne (Austrália). A análise das universidades no Brasil envolveu as seguintes instituições: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Para a análise dessas instituições selecionaram as disciplinas correspondentes aos conteúdos das literacias digitais encontradas nos cursos. Analisaram as propostas das disciplinas e refletiram sobre as possíveis causas da insuficiência desses conteúdos, buscando “discutir e apresentar alternativas aos modelos acadêmicos, tanto na dimensão das experiências concretas em desenvolvimento, bem como das discussões e do pensamento teórico sobre a matéria”.
Dentre os três cursos brasileiros de pedagogia analisados neste trabalho, os autores identificaram que as matrizes curriculares apresentam deficiência na oferta de disciplinas que abordem as literacias emergentes. Dados sobre essas disciplinas é possível observar no quadro disponibilizado na página 38 do trabalho:
Legenda: Quadro disponibilizado pelos autores na página 38.
Com esse trabalho, verificou-se que em 2014 a oferta de disciplinas que abordavam as literacias digitais nos cursos de Pedagogia eram insuficientes para a formação de docentes capazes de utilizarem as tecnologias nos contextos educacionais.

2015

“Transliteracia na palma da mão: o smartphone na educação do século XXI”

Partindo do pressuposto que na sociedade do conhecimento, o acesso à informação, o ciberespaço e as transliteracias promovem a ressignificação de identidades,, especificamente, a relação entre professores e alunos deve ser repensada no processo de ensino-aprendizagem mediado por tecnologias educacionais.

O artigo propõe um percurso histórico das tecnologias digitais “do papel para as telas”, pautado em conceitos como literacia multimidiática, sociedade conectada, big data e interatividade de interfaces e linguagens para apresentar a utilização de smartphones em projetos educativos. Os autores afirmam que “concepções unidirecionais de educação comprometem o processo dialógico interativo” (p.4) e diante de novas sociabilidades, diferentes culturas identitárias nas redes digitais, convergências e mobilidade, estabelece-se uma “rede de saberes” que precisa ser analisada.. A partir de relatórios da Unesco, em especial do programa MIL (Media and Information Literacy) e do PISA (Programe for International Student Assessment - 2009  e 2012), houve um mapeamento da Educação 3.0 (impulsionada pelas TICs do século XXI), em relação à Educação 2.0 (impulsionada pela linha de produção do século XX) e à Educação 1,0 (impulsionada pela sociedade agrícola-pastoral até o século XIX).

“Entre as pessoas que utilizam a internet principalmente por smartphones e tablets, pesquisa realizada pela F/Nazca e Data Folha revelam que 54% são do sexo masculino, 68% possuem entre 16 e 34 anos, 48% são da classe A/B e 54% completaram o ensino médio. Além disso, 63% dos brasileiros desse segmento utilizam o plano pré-pago (que é mais econômico) e 19% possuem um dispositivo móvel sem qualquer plano de dados, restritos ao uso do WiFi dos locais em que se encontram”.(p.14)

De acordo com os autores, a Cultura Digital e as TICs são meios que oferecem suporte a diversas modalidades e funcionalidades, que alteram o cenário educacional e caracterizam a sociedade conectada do conhecimento.

Já no cenário brasileiro, 25,6% dos jovens não possuem computadores em casa, enquanto apenas 1,8% não possuem celulares - sendo que aproximadamente 73,2% possuem três ou mais aparelhos em casa, enquanto apenas 9,1% possuem três ou mais computadores. Estes dados (2012) evidenciam que o uso de celulares e smartphones entre os jovens é muito mais difundido no país do que o de computadores, o que os torna ferramentas mais acessíveis e com as quais os estudantes já estão familiarizados. (p 35)

Com as referências teóricas pertinentes à disciplina e o preceito de ideal comunitário de Maffesoli (2006), os autores traçam o caminho da interatividade na educação e da transliteracia por smartphones na citação dos projetos de tecnologia educacional: Mobile L (ferramenta saber 3 L); Minha Vida Móbile (MVMob) e Seeds of Empowerment.. E concluem que “ter acesso às tecnologias não é sinônimo de melhorias práticas na educação, a interação a fim de construir conhecimento é potencializada com a mediação do professor” (p.45)

2018

“Entre Maniac e Eniac: Conexões conceituais entre a série de ficção e as teorias sobre tecnologia da informação do séc XXI” 

Os autores do trabalho mostram uma visão bastante interessante sobre “absurdo” para retratar a hiperconectividade contemporânea a partir do contexto da série Maniac, da Netflix, lançada em 2018. Para desenvolver o tema abordado, fornecem um panorama geral da série, a qual foi tratada como uma ilustração de todas as principais teorias da informação e da comunicação que são tão importantes para a análise dessa nova onda, conectada a todo instante e com reverberações tecnológicas, sociais e psicológicas.
A partir das muitas situações relatadas pela série, é possível perceber a relação entre os teóricos apresentados na disciplina e os dilemas cotidiano do mundo contemporâneo. Exemplo claro é a questão do transhumanismo, isto é, segundo alguns autores como Bostrom (2005), a forma atual da espécie humana estaria na sua fase inicial de desenvolvimento, próxima a se transformar em “máquina-humana”, seja pelo auxílio contínuo da inteligência artificial ou até mesmo implantando dispositivos tecnológicos com o intuito de melhorar resultados físicos e/ou fisiológicos.
Além disso, ao retratar a hiperconectividade, a série também aborda o pensamento de Floridi (2015) em que é impossível estar, de fato, desconectado. O autor aponta, assim como a obra ficcional Maniac, algumas consequências para o sistema cognitivo decorrentes da abundância de informações, tais como a sobrecarga mental, a amnésia e a distração. 
Outra questão apontada pela série é a do tratamento comercial de dados, ou Big Data. Para Lanier (2010), ao utilizarmos as redes sociais, fornecemos dados e consumimos publicidade em troca da gratuidade desse serviço. Ou seja, para usar as redes sociais nos transformamos, de maneira consciente e gratuita em produtos pós-modernos. Pagamos com os nossos dados, e vendemos nossa atenção, para que o mercado publicitário se torne o responsável pela financeirização.
A partir do exposto, é possível perceber que, mesmo em tom futurista, a produção capta problemáticas bastante atuais e contemporâneas, o que gera ainda mais vínculo com o telespectador, o qual se enxerga nos personagens. Ele percebe que as situações cotidianas são também obra de ficção e, mais do que isso, o seu presente é também um futuro imprevisível, o que pode ser assustador e reconfortante ao mesmo tempo.
O grupo desenvolve um estudo de estado da arte destacando os autores, obras e teorias que relacionam com o tema da série. Dentre os autores, destacam-se o francês Bruno Latour, antropólogo, sociólogo e filósofo da ciência. Nick Bostrom, filósofo sueco, com seu estudo sobre a filosofia da inteligência artificial. E o americano Jaron Lanier, um dos precursores da realidade virtual. A série Maniac, da Netflix, praticamente ilustra as teorias abordadas, as quais são muito relevantes para analisar e compreender a era da hiperconectividade com suas relações humanas diferenciadas, que muitas vezes levam até à dependência com as máquinas, com destaque para a mobile fobia.
A hiperconectividade, compreendida como conectividade contínua, abrange os fluxos e refluxos das interfaces de mediação informativas e comunicacionais dos atores em rede. Ao propor o “melhoramento humano” a partir da interação entre atores humanos e não-humanos, a série representa o desenvolvimento da inteligência artificial em busca de “empatia” e digitalização dos sentimentos e das emoções. Os atores em rede (Latour),  configuram as modificações da rede, que vitaliza-se ao produzir e direcionar ações. As tecnologias disruptivas que propiciam a emulação cerebral autônoma ou uploads da mente humana para computadores (Bostrom) coexistem com a nanotecnologia, que gradativamente combate o envelhecimento, as doenças e a morte de uma “raça pós-humana”. As dicotomias entre real e virtual, online e offline desaparecem a partir das interações entre máquinas, humanos e natureza em uma revolução da mobilidade (Floridi). Nesse sentido, as TICs, mais que ferramentas, apresentam-se como forças ambientais (Di Felice) de uma era informacional, que exige novas literacias e transliteracias (Passarelli) em todas as esferas da vida social. Apresentado como “aprisionamento tecnológico” (Lanier), o caminho traçado, o mapa desenhado, o limite transposto constituem-se diariamente como desafios de navegação em um mar informacional que produz ondas em sua infinitude, muito além da linha do horizonte.

REFERÊNCIAS
BOSTROM, N. A history of transhumanist thought. Journal of evolution and technology 14.1 (2005): 1-25.
FLORIDI, L. The onlife Manifesto - Being human in a hyperconnected Era. Londres, Springer Open: 2015.
LANIER, J. Gadget, você não é um aplicativo - São Paulo. Ed.Saraiva, 2010


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