Resenha - Geração Interativa no Brasil: Uso das telas pelas crianças e adolescentes


Interactive Generation Brazil Research: children and teenagers sing computers, TV, games and mobile phones

Passarelli, Brasilina, and Alan César Belo Angeluci. "Interactive generation Brazil research: Children and teenagers using computers, TV, games, and mobile phones." Rethinking the conceptual base for new practical applications in information value and quality. IGI Global, 2014. 284-303.

Esta resenha foi escrita a partir da leitura do artigo “Interactive Generation Brazil Research: hildren and teenagers sing computers, TV, games and mobile phones” produzido por pesquisadores da Escola do Futuro – USP e é parte de uma pesquisa quantitativa feita pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE) em 2010, idealizada e financiada pela Fundação Telefônica do Brasil.

A geração das crianças e adolescentes de hoje surgiu imersa a uma sociedade amplamente globalizada e conectada a partir da mediação por tecnologia das tecnologias da informação e comunicação (TIC). Conhecer a forma como essa nova geração brasileira interage com as mídias é algo importante para promover políticas educacionais a partir de diagnósticos reais. Dessa forma, esse artigo objetivou compreender e descrever o uso de quatro mídias no Brasil: computadores, TV, jogos e telefones celulares a partir da análise e relato da coleta de dados feita em cima de duas pesquisas desenvolvidas pelo IBOPE: uma com 60 perguntas dedicadas a crianças e outra com 167 perguntas para adolescentes. As crianças tinham entre 6 e 9 anos e adolescentes de 10 a 18 anos. Os entrevistados foram em todo o país, em áreas urbanas e rurais e escolas públicas e privadas brasileiras. Para garantir a representatividade dos resultados da pesquisa, foi extraído um controle amostral considerando variáveis como sexo, idade, região, localização (urbana / rural) para cada grupo.

Dados das crianças e adolescentes entrevistados:

                                                 Tabela 1 – Região (criança)
Norte
Nordeste
Centro-oeste
Sudeste
Sul
12%
21%
21%
30%
21%


                                      Tabela 2 - Tipo e local da Escola (criança)
Privada urbana
Públicas urbanas
Pública rural
15%
53%
32%


                                     Tabela 3 - Tipo e local da Escola (Adolescente)
Privada urbana
Públicas urbanas
Pública rural
18%
52%
30%


Nas tabelas 2 e 3 nota-se uma representatividade bem maior das escolas Públicas urbanas.
Em relação à idade dos adolescentes entrevistados, o perfil dos adolescentes apresenta um percentual de equilíbrio na maioria das idades, sendo um pouco maior para os 11 anos de idade.
Em relação aos recursos financeiros declarados pelos adolescentes de acordo com a região, temos que:
-           A região Norte apresentou maior taxa de declarados com recursos insuficientes;
-           A região Centro-oeste apresentou maior taxa de declarados com recursos suficientes;
-           A região Sudeste apresentou maior taxa de declarados com recursos mais que suficientes.

Perguntas do artigo:
O que encontramos nesses dados? Quais questões emergem estritamente ligadas à alfabetização digital e ao hibridismo da sociedade? Para respondê-las de forma sistemática, os autores organizaram uma seção em duas camadas, das quais a primeira apresenta as principais descobertas e explora mais a visão das quatro telas analisadas e a segunda apresenta as características transversais observadas e pode ser vista como tendências emergentes.

Camada 1:
Computador
            A presença de computadores em domicílios brasileiros está inter-relacionada a dois fenômenos importantes: disponibilidade de conexão à Internet e crescimento de dispositivos de computador portátil.
-         Computador com conexão à internet: crescimento de 11% de 2010 a 2011;
-         Posse dos dispositivos de computador portátil: crescimento de 13% de 2009 a 2011;
-         Localização do computador (adolescentes): maior taxa para os espaços coletivos em áreas rurais e maior taxa para o quarto do adolescente em áreas urbanas;
-          Conexão à internet por região (crianças): maior taxa na região sudeste e menor taxa nas regiões Norte e Nordeste. Coerente com a desigualdade econômica;
-         Acesso público às TIC por região (adolescentes): a limitação do Nordeste em relação à posse domiciliar é superada pelo hábito de acessar web em cybercafés - muito popular na região;
-         Aprendizado do uso da internet (adolescentes): auto-aprendizagem e autonomia é um aspecto forte na geração dos nativos digitais, que é estritamente aliada à sua capacidade de letramento digital no uso do computador.

TV

A TV é o aparelho mais popular do país, desde o seu lançamento nos anos 50, e sua penetração chega a mais de 95%. A TV aberta (transmissão) é a mais assistida. A TV no país é bem próxima da universalidade.
-        Localização da TV (crianças): taxa maior na sala dos domicílios, se caracterizando como elemento integrador. O uso individual nos quartos das crianças vem logo em seguida.
-        Localização da TV por áreas (adolescentes): tanto nas áreas rurais como nas urbanas, a TV é localizada mais na sala do que nos quartos. Porém a diferença entre a preferência da sala e quarto é muito maior nas áreas rurais do que nas áreas urbanas, ou seja, o elemento integrador é muito mais forte nas áreas rurais.
-        Companhia para assistir TV (criança): a mãe é a mais desejada, porém o hábito solitário de assistir à TV é tão recorrente quanto o hábito se assistir na companhia da mãe.
-        Atividades paralelas ao assistir TV (adolescentes): os adolescentes brasileiros são considerados multitarefa. Porém há uma distinção de gênero: meninos são mais propensos a se envolver com atividades mais ativas e as meninas normalmente preferem as relações sociais.
-         Conteúdo assistido (adolescentes): Há uma tendência por filmes. Sobre outros conteúdos, os meninos preferem canais de esporte e as meninas preferem reality shows e programas de celebridades.

Jogos (videogames e jogos de computador):

Os jogos são uma indústria muito importante no país, com desenvolvimento tecnológico intensivo e o acesso mais amplo a computadores conectados a plataformas móveis e de internet. Isso está causando mudanças em linguagens e plataformas de jogos e tira a exclusividade de jogos de consoles offline.
-        Costume de jogar (crianças): mais de 65% dos entrevistados;
-        Hábito e posse de jogar por região (crianças): as crianças do Nordeste e, principalmente, do Norte jogam menos do que as outras regiões do Brasil.
-        Hábito de jogar no computador (adolescentes): mais de 77% dos entrevistados em todas as regiões. Jogos em computador de mesa, seja off-line ou on-line, estão adquirindo uma abordagem ainda mais popular.

Celulares:
Sua penetração massiva parece ser uma tendência, já que pode ser considerada uma das plataformas mais convergentes que agregam diversas aplicações e serviços por um custo relativamente baixo.
-      Acesso e uso de celular por região (crianças): há uma desigualdade significativa entre algumas regiões. A mais significativa está entre as regiões Norte e Suldeste com 46,4% da primeira, de uso e acesso, conta 68% da segunda. Infraestrutura de tecnologia e economia podem explicar esses números.
-      Responsável pelos custos (adolescentes): os pais são os principais responsáveis (69,5%).  Uma parte dos entrevistados (25%) é independente.
-      Com quem falam mais? (adolescentes): mães e amigos.
-     Comparação entre o uso de TV e uso do celular (crianças) por gênero: meninos preferem ver TV e meninas preferem usar o celular. Coerente com uma análise anterior que identificou que as meninas se interessarem mais por tarefas ligadas ao relacionamento social.
Camada 2: Tendências Emergentes
Esta pesquisa definiu cinco eixos de análise para serem apresentados como os resultados mais relevantes desta pesquisa.

Crescimento de conectividade exponencial

Crianças e adolescentes brasileiros são uma geração fortemente conectada a telas e tecnologias digitais para situações de entretenimento, aprendizado e relações sociais: maioria dos entrevistados possuem computadores, internet em casa, aparelhos celulares, sem falar na TV que está presente quase 100% dos lares brasileiros.
Os jogos apresentam taxas de uso maiores que computadores e celulares, indicando um crescimento e importância na vida contemporânea.
Os adolescentes querem estar 24h conectados e disponíveis para quem quiserem interagir com eles.

Convergência de telas e multifuncionalidade

De acordo com os entrevistados, essa geração é multitarefa. Conseguem realizar várias atividades sem prejudicar nenhuma delas.
Os computadores, por exemplo, já integram várias funções que eram restritas ao celular e vice-versa. O celular tem um destaque maior ainda, pois aprimora a tendência multitarefa por ser móvel, portátil, inteligente, e possui funções que antes só era possível em telas diferentes (computador, TV, jogos).

Literacias Digitais Emergentes

Os dispositivos móveis e portáteis permitem a realização de várias atividades simultâneas. Nativos dessa literacia, a geração interativa possui uma característica única que é a realização de várias atividades ao mesmo tempo.

Múltiplas mediações

O Gênero, faixa etária, família, escola e infra-estrutura das regiões apresentaram influência importante na mediação dos dados:

- Comportamentos de Gêneros Diferentes:
Os meninos estão mais inclinados a utilizarem as telas para atividades de ação (baixar filmes, musicas, software, jogar), enquanto as meninas para atividades de relacionamento (enviar mensagens, bate-papo, falar ao telefone) e usam mais o celular do que os meninos.
É destacado, também, o uso solitário das telas. Grande maioria dos adolescentes revelou utilizar a internet sozinho e maioria das crianças revelou jogar sozinha. Isso se deve a cultura de posse e localização das telas nos seus quartos.

- Família: Controlando, Ensinando, Compartilhando:
Os computadores nos quartos das crianças e adolescentes torna o ambiente do lar mais individualista, enquanto a TV continua sendo a tela que une os membros da família.
A participação dos pais é analisada pela diferenciação de gênero no controle das telas: as meninas são mais monitoradas quando usam as telas do que os meninos.
As literacias do pai e da mãe são diferenciadas ao interagir com as crianças e adolescentes. O primeiro é mais presente no compartilhamento e transmissão de conhecimento sobre tecnologia. A segunda é mais solicitada para problemas de relacionamento. Normalmente ela quem lida com as crianças e adolescentes pelo telefone.

- Escolas: Esforços no Acesso e Integração de uso da TIC:
O uso da TIC no ambiente escolar é incentivado desde 1980 a fim de dispor de equipamentos e capacitar os professores. Estes têm um papel importante na mediação do aluno com os dispositivos. Os resultados das entrevistas mostram que os adolescentes aprendem a usarem a internet mais com os professores do que com pais e mães. Ele só perde para o auto-aprendizado que é bastante recorrente. O ponto de acesso à tecnologia também é outro questão importante, pois a escola é o segundo local que mais se tem contato, sendo a casa o primeiro local. Especialmente para as crianças, os professores são os principais intermediadores da alfabetização digital, principalmente nas áreas rurais.
- Diferença entre gerações:
Há uma diferença de gerações onde as crianças e adolescentes nasceram imersas a essa era digital e acabam aprendendo mais rápido as novas literacias enquanto os adultos, geralmente, se esforçam mais para isso. Outro fato é que o primeiro contato das crianças com as tecnologias acontece precocimente (80% dos adolescentes tiveram seu primeiro celular antes dos 13 anos de idade). Dessa forma, existe um desafio entre a experiência dos adultos com as habilidades dos nativos digitais.

Desigualdades nas infraestruturas regionais

As diferenças socioeconômicas entre as regiões brasileiras revelam uma influência decisiva nas oportunidades de acesso e posse de crianças e adolescentes em relação às telas.
O centro-oeste se destaca pela seu desenvolvimento econômico desde a expansão ocidental da década de 50 com infraestrutura, energia, abastecimento de água, telecomunicação e etc. Suldeste e sul também tiveram um bom desenvolvimento econômico. Em contrapartida, o Norte e Nordeste tiveram um desenvolvimento econômico inferior e o acesso, posse e consumo das telas se tornaram mais difíceis. Dessa forma, os alunos dessas regiões são forçados a terem uma experiência de compartilhamento de dispositivos. Esse efeito do compartilhamento também acontece na comparação das áreas rurais e urbanas. As crianças e adolescentes das áreas rurais tendem a serem mais sociais e precisam compartilhar as telas no ambiente doméstico. Nas cidades, há um privilégio para os espaços individuais e atividades solitárias.

Mudando para frente

Esse trabalho foi o primeiro nacional que pesquisou o uso dos diferentes meios de comunicação entre crianças e adolescentes e trouxe como destaque o crescente protagonismo do celular frente aos outros dispositivos devido sua multifuncionalidade.
Não se trata de uma pesquisa conclusiva e muito pode ser feito a partir dos dados coletados.
Outra questão é que a tecnologia muda num passo acelerado e novas tendências podem surgir. Assim, é importante acompanhar novas pesquisas sobre a mesma população para melhor entender os futuros comportamentos alimentados pelas novas tecnologias e interações entre gerações. Dessa forma, é possível elaborar melhor as políticas públicas educacionais para o bom desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem do Brasil.

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