RESENHA - Gadged, você não é um aplicativo – Jaron Lanier







Nascido em 1960 nos Estados Unidos, Jaron Lanier é cientista da computação, estudioso de realidade virtual, músico e artista visual.  É doutor honorário pelo New Jersey Institute of Technology. Escreveu vários livros sobre cultura digital e a influência da mesma no contexto social, entre eles Info is na Alienated Expensa, You are not a Gadget: a Manifesto e Who Owns the Future

A ideia de trabalhar nesta resenha a obra, You are not a Gadget, que em português recebeu o título de Gadged, você não é um aplicativo, e especificamente a parte 3 da obra, chamada de "A Insustentável tenuidade do nivelamento", em vez da obra sugerida Who Owns the Future, foi trazer para discussão um contraponto que considero bastante relevante: o quanto o autor percebe os aspectos ligados ao passado na construção das bases da sociedade do futuro. O quanto ele percebe que nem a evolução do meio foi suficiente para desvincular o pensamento do passado. Para isso ele analisa três ambientes: o da programação, o da música e a própria cultura digital.

A nostalgia reinante na cultura digital 

O autor abre a análise falando sobre o que ele chama de totalitarismo cibernético em que as pessoas colocam a tecnologia em detrimento do ser humano. A máquina que surge para deixar a nossa vida mais fácil não pode ser transformar em um emaranhado de nós tornando a nossa vida mais complexa. Por outro lado quando falamos dos programadores, cabe a eles sim entrar no emaranhado complexo de códigos para tornar a vida do usuário mais simples. Mesmo trabalhando em uma crítica ao que ele considera falta de originalidade por parte de muitos programadores, ele ressalta a importância do movimento do software livre diante da formação de impérios da tecnologia

Voltando à questão da remissão ao passado e a pouca inovação real diante do cenário propício, o autor reflete sobre a falta de originalidade e inovação de parte da nova geração da cultura digital. Acredita que o que as novas gerações trazem como inovador são na verdade releituras de propostas já existentes com algumas alterações de formado. Como exemplo dessas releituras cita a criação do Linux e da Wikipedia.

Questiona o quanto as novidades são expressões derivadas travestidas de expressões de primeira ordem. Enfatiza ainda o quanto a rede livre de informações produz conteúdos de baixa relevância e produções baratas ou bizarras. Mas nesse caso entra em defesa não necessariamente do conteúdo em si mas do fato de que ele não é algo que chegou com a internet. A internet então estaria basicamente recriando material de baixa qualidade e conteúdo e produção, repetindo uma prática já existente off line.  Ou seja, não se pode responsabilizar o meio ou a abertura que ele traz por esse tipo de produção Para ele o mundo on line fez apenas uma migração do já existente no mundo pré-web.

Analisa o quanto a internet ainda mantém características de sua criação na época da segunda guerra quando foi concebida para a transmissão de blocos de dados em vez de se tornar um instrumento base para uma revolução na comunicação.

Um sistema de transmissão de difícil rastreabilidade ou de encontro do ponto de origem, , lembrando que os arquivos se fragmentam na transmissão e se recompõe no computador de destino. A preocupação crescente com a segurança da informação e com o anonimato leva os desenvolvedores a tornarem os sistemas cada vez mais complexos e cheios de camadas para tornar a vida do usuário mais simples e mais segura.

Mas essa complexidade não desanimou os desenvolvedores, muito pelo contrário. Isso porque o movimento do software livre nasceu com ar de revolução mas não se consolidou como tal, daí a sua crítica. Em vez de saírem às ruas para protestar como se faz historicamente no mundo até então, o movimento de rebeldia desses jovens se deu atrás de uma máquina formando uma grande rede de conectividade. A relação homem computador apesar de parecer solitária se dava em rede formando um grande movimento para lutar contra os gigantes da informática que atuavam de maneira fechada e protegida colocando seus sistemas de maneira limitada e tiranicamente administrados como o autor classifica. Para ele uma incoerência já que uma proposta de acesso e liberdade não poderia ficar fechada em grandes empresas.

Relata sua experiência na época da faculdade ao lado do programador Richard Stallman nessa construção de um sistema que viesse de baixo para cima, permeando da concepção da arquitetura até o usuário final a partir da própria máquina e não simplesmente do sistema. Era o chamado Lisp, que hoje é muito bem visto por que trabalha com inteligência artificial. Daí veio o nascimento do Unix, que foi uma linguagem que precedeu o Linux que deu mais visibilidade ao movimento do software livre. Apesar de sua importância histórica o Linux não atraiu o usuário comum pela interface ser menos amigável que os sistemas produzidos pelas grandes empresas. O autor destaca a importância histórica mas ressalta que não foi suficiente para promover a revolução que poderia se esperar desse projeto, daí fundamenta o movimento que começou com ares de revolução foi se tornando uma reciclagem de ações do passado. Se por um lado ele defende o código aberto por outro critica a pouca relevância que ele teve na capacidade de promover efetivamente algo novo

Ainda dentro de sua crítica da releitura do passado o autor traz também para esse universo a questão da presença da música na internet – aproveitando o fato de ele mesmo transitar entre as duas áreas – programação e música. Nesse ponto, assume as expectativas exageradas que teve com a inclusão da música no mundo da internet. Novamente considera que a revolução que ele esperava não aconteceu, pelo menos na intensidade esperada.

Após analisar o que ele chama da período de apatia e pouca movimentação revolucionária da geração X inclusive na música, ele olha para a internet colocando a música em todos os lugares mas com um papel diferente do que ele esperava. Ressalta a falta de personalidade da música em época de internet, diferentemente das criações e transformações marcadas pelas décadas anteriores. De um lado o fone de ouvido levando a música que até então era aberta nos ambientes para uma experiência individual intensa enquanto em outros ambientes ela se torna o fundo ou sendo minimizada diante do ambiente ruidoso ou sendo um elemento para substituir algum tipo de silêncio. Nesse papel tão importante da música na história da humanidade, Lanier reconhece a não-revolução. O reaproveitamento do retrô na música da era da internet.

Ainda dentro dessas percepções e aproveitamento do passado em detrimento da revolução, o autor fala da própria cultura digital com características nostálgicas, situação que ele chama de vergonhosa diante das possibilidades que o digital abre. O novo século talvez não esteja preparado para sustentar sua própria cultura conclui.

Aluna: Karen Gimenez

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